Tio,

Quero te pedir para não me ligar mais. Não adianta fazer essas perguntas. Eu não sei responder. Eu não sei.

Conheci o Rafa naquele dia mesmo, troquei poucas palavras com ele. Ele tinha bebido cerveja, mas não sei se tinha fumado. Quando me despedi, ele disse que também estava indo, “ia comer uma parada”.

Tio, não me pergunte se Deus existe. Não sei. Por que os jovens morrem? Não sei. Aqueles jovens chorando. Jovens não, adolescentes. Na verdade, aquelas crianças, chorando copiosamente pelo garoto. O seu garoto, tio. Eu sei. Mas não sei de nada. Desculpe.

Que gosto tem tua boca?

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Gosto de leite –
Do café da manhã.
Gosto do álcool –
Da noite anterior.
Ou gosto do trago –
Amargo do cigarro pós-coito.

Cuidado menina!
Com os gostos dessa boca
Seca a sáliva
Ácida do medo
Gosto daquela carência insistente
Nem o doce do doce
Inunda esse sorriso
Nem a calma da água
Alivia teu gosto.

*Também em http://aiachismo.com/

Ele perguntou o que eu queria.
Eu disse...

Vamos dançar a noite toda.
O samba da melancolia.
O bolero em sua mais pura melodia.
Não há tango nessa festa.
Nem valsa, nem dois.
Só o rock solitário
Dos olhos negros
Da alma vã
Vamos dançar descalço
Com os pés sujos de restos
Da noite
Machucados dos cacos
Com bolhas quentes
Grandes e aguadas.
Vamos dançar
Até cair –
Desistir e dormir.

Prefiro o sofrimento molhado
O choro sincero
Do que aquele seco
Preso na garganta
Dolorido
Em forma de nó.
Prefiro essas lágrimas doces
Essa fraqueza real
Do que essa pose ensaiada
Prestes a desabar.